quarta-feira, agosto 01, 2007

Ver TV

Uma Série Viciante

O elevado nível de sub-ocupação a que tenho sido votado nos últimos tempos tem-me possibilitado uma leitura mais atenta da programação das nossas televisões, bem como a dedicação de mais umas horas diárias àquilo que o pequeno ecrã tem para me oferecer. O segundo canal da estação pública tem vindo a assumir-se, por via da mensagem que nos é transmitida pelos seus spots promocionais, como aquele que oferece as melhores séries da televisão portuguesa. E, se é verdade que existe algum exagero nesta publicidade, o que é certo é que é a RTP2 o canal de televisão que menos maltrata as séries que exibe, sobretudo em termos de horários e de fidelidade ao público-alvo.

O melhor exemplo do que acabámos de referir é o horário 22h30-23h30 de segunda a sexta-feira, em que a 2: nos presenteia com algumas das melhores pérolas de ficção da televisão portuguesa. Se não, vejamos. Comecemos por congratular-nos pela excelente iniciativa de exibição da série Anatomia de Grey às terças-feiras, desde o primeiro episódio da primeira temporada, substituindo Serviço de Urgência. Uma das mais aclamadas séries dos últimos tempos, que retrata os dramas e as emoções de uma equipa hospitalar, depois de muito maltratada pela RTP1, onde teve mais de três horários diferentes, no último dos quais empurrada para as madrugadas diárias, pode ser, finalmente, devidamente apreciada.

À quarta-feira, prosseguem as atribuladas e vertiginosas aventuras de Jack Bauer em 24. A série, protagonizada por Kiefer Sutherland, perdeu muita da originalidade e emoção das primeiras temporadas e vive de uma fórmula já um pouco rebuscada e repetitiva, mas continua a deliciar os telespectadores mais fiéis. O Meu Nome é Earl, uma deliciosa e bem-humorada série acerca de um homem que resolve mudar o seu estilo de vida, anima as noites de quinta-feira na RTP2. E à sexta, absolutamente imperdível, Irmãos e Irmãs, a série que retrata de uma forma brilhante as vivências de uma família disfuncional norte-americana, fazendo lembrar, em muitos aspectos, Six Feet Under (Sete Palmos de Terra), aquela que foi, provavelmente, a série com o melhor argumento dos últimos tempos.

Mas o foco principal da minha análise é a mais recente aposta do segundo canal para as noites de segunda-feira, o meu mais recente vício, como o nome que lhe dá o mote. Weeds, série norte-americana de 30 minutos lançada pela RTP2 com o título Erva, é, seguramente, a série mais original e melhor escrita da televisão portuguesa, desde a passagem pelo pequeno ecrã das aventuras da família Fisher na já citada Sete Palmos de Terra.

Criada pela argumentista e produtora Jenji Kohan, Weeds constitui um magnífico exercício de ficção, em que esta se cruza com a realidade de uma forma insólita e fascinante. A história é a de uma mulher que enviúva jovem e que, para sustentar a família, começa a comercializar marijuana. Daqui até o tarado irmão do marido lhe oferecer um vibrador como prenda ou o filho mais novo ser suspenso na escola depois de provocar uma batalha no recreio, é um pequeno passo. Ou seja, Weeds explora de uma forma sublime cada personagem e faz uma brilhante sátira aos valores de uma sociedade representada por uma família dos subúrbios ricos de Los Angeles. Sem estereótipos ou generalizações. Sem pretensões de moralismo ou bom-senso. Um retrato fiel das relações humanas. Um exercício de estilo algures entre a ironia e a realidade. Uma série recheada de ambiguidades. Como a vida.

Mary Louise Parker, até aqui actriz secundária em vários filmes, encontra em Weeds a oportunidade de ouro para provar todo o seu valor. Desconcertante, estranha, mas genial e a todos os títulos brilhante, a protagonista lidera um bom elenco que, associado à excelência do argumento e dos diálogos, transforma Weeds num caso sério de sucesso nos Estados Unidos. A confirmação de uma série viciante, a apreciar com dedicação nas próximas noites de segunda-feira na RTP2.

Um único senão para o facto de Weeds ser exibida em dose dupla, com dois episódios semanais, abruptamente interrompidos na ligação entre ambos, quando se percebe perfeitamente que cada episódio de meia hora foi concebido e idealizado para ser “devorado” isoladamente, com uma dinâmica própria do género, fazendo lembrar os 30 minutos frenéticos de Seinfeld. Ainda assim, é bem melhor ver 2 episódios às 22h30 do que um episódio isoladamente às 2 da matina. E, nesse aspecto, há que louvar a RTP2 pela forma como são tratadas algumas das melhores pérolas televisivas do momento. E Weeds é, seguramente, uma delas.

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