sexta-feira, fevereiro 27, 2009
quarta-feira, fevereiro 25, 2009
"Vida breve teve Cesário Verde. Nasceu em Lisboa em 25 de Fevereiro de 1855, morreu em Lisboa a 19 de Julho de 1886. Tinha 31 anos, idade absurda para morrer com uma tuberculose. Eu, que não aprecio poetas com obra extensa com a provável excepção de Shakespeare e poucos mais, tudo génios, aprecio em Cesário a modernidade urgente da sua poesia, que cabe toda em 166 páginas (reedição da Dom Quixote, com fixação de texto e nota introdutória de Joel Serrão e revisão e notas de Jorge Serrão). Cesário Verde pode ter morrido cedo, pode ter sido esquecido, pode ter sido uma das vítimas da sombra pessoana projectada sobre quase toda a poesia portuguesa posterior. Continua a ser um dos maiores poetas da língua portuguesa e, passe a hipérbole, da literatura europeia, mundial, o que quiserem. Cesário Verde é mais conhecido por causa do seu «Sentimento de um Ocidental», que a vulgata adoptou como tema e transfiguração de uma Lisboa de fim de século. Hoje, este poema é mais o seu nome, citado a propósito de tudo e de nada, do que os seus versos, que quase ninguém leu. Deve-se a Joel Serrão a publicação em 1963 (por que é que em Portugal tudo demora tanto tempo?) da «Obra Completa» de Cesário Verde. Antes, «em 1919, um incêndio destrói quase por completo a casa de Linda-a-Pastora (onde o poeta vivera isolado nos últimos anos), fazendo desaparecer irremediavelmente todo o seu espólio literário». Em 1887, com uma tiragem de 200 exemplares, foi publicado pela primeira vez «O Livro de Cesário Verde», numa edição do seu amigo Silva Pinto, tendo uma nova edição, já com distribuição nas livrarias, sido feita em 1901. Escreve Joel Serrão que o amigo do poeta, e admirador, Henrique Lopes de Mendonça, lhe vaticinou sombrio futuro na história da literatura: «A tua obra pequena e dispersa não é daquelas que se impõe à admiração condicional da posteridade». A posteridade é o que é, sendo às vezes cega, surda e muda mas, no caso de Cesário Verde, alguma justiça viria a ser prestada pelos que entendem de poesia. Existe quem jure, Vasco Graça Moura entre eles, que a poesia de Cesário é superior à de Pessoa. Eu, que detesto campeonatos de poetas, tenho por Cesário uma paixão, que agrafei à perfeição dos seus versos. Cesário é mais um poeta do século XX do que do século onde nasceu, e a sua linguagem, estilo, métrica, vocabulário, a concisão dos seus «alexandrinos originais e exactos», como ele diz, sagram-no como um dos inventores do português que usamos. Maria Filomena Mónica, na notável biografia que escreveu de Eça de Queiroz, chega a uma conclusão semelhante. Se Eça libertou a prosa portuguesa da «retórica fradesca» que a dominava, Cesário libertou a língua das amarras do lirismo piegas e do sentimento exaltado, das teias de aranha do ideal parnasiano e do romantismo rendilhado. Maria Filomena Mónica diz que nenhum autor inovou como Eça, «com a possível excepção de Cesário Verde». Eu tiraria o adjectivo «possível»."
Clara Ferreira Alves, Jornal EXPRESSO, 19-5-2001
Assinalam-se hoje 154 anos sobre o nascimento de um dos maiores poetas da história da literatura portuguesa. Não é um pintor, é Cesário Verde quem antecipa o impressionismo em Portugal, no final do Século XIX. O seu poema De Tarde apresenta-se ao leitor como uma verdadeira tela de Renoir:
Naquele “pic-nic” de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, indo o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Cesário Verde
segunda-feira, fevereiro 23, 2009
A 23 de Fevereiro de 1987, faz hoje 22 anos, morre, em Setúbal, o compositor português de música de intervenção, José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos, mais conhecido por Zeca Afonso.
Traz outro amigo também
Amigo
Maior que o pensamento
Por essa estrada amigo vem
Não percas tempo que o vento
É meu amigo também
Em terras
Em todas as fronteiras
Seja benvindo quem vier por bem
Se alguém houver que não queira
Trá-lo contigo também
Aqueles
Aqueles que ficaram
(Em toda a parte todo o mundo tem)
Em sonhos me visitaram
Traz outro amigo também
Zeca Afonso
Oscar 2009 - And The Winner Is...
Actriz secundária: PENELOPE CRUZ, VICKY CRISTINA BARCELONA
Argumento original: DUSTIN LANCE BLACK, MILK
Argumento adaptado: SIMON BEAUFOY, QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Longa-metragem de animação: WALL-E
Curta-metragem de animação: LA MAISON EN PETITS CUBES
Cenografia: O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON
Figurinos: A DUQUESA
Maquilhagem: O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON
Fotografia: ANTHONY DOD MANTLE, QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Curta-metragem: THE PIG
Actor secundário: HEATH LEDGER, O CAVALEIRO DAS TREVAS
Documentário de longa-metragem: HOMEM NO ARAME
Documentário de curta-metragem: SMILE PINKY
Efeitos Visuais: O ESTRANHO CASO DE BENJAMIN BUTTON
Efeitos Sonoros: O CAVALEIRO DAS TREVAS
Som: QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Montagem: QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Banda Sonora Original: QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Canção Original: QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Filme Estrangeiro: DEPARTURE (Japão)
Melhor Realizador: DANNY BOYLE, QUEM QUER SER BILIONÁRIO?
Melhor Actriz: KATE WINSLET, O LEITOR
Melhor Actor: SEAN PENN, MILK
Melhor Filme: QUEM QUER SER MILIONÁRIO?
A história de um rapaz dos bairros de lata de Mumbai conquistou a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, vencendo todas as estatuetas para que estava nomeada, com excepção do prémio para Mistura de Som, em que perdeu para Batman e "O Cavaleiro das Trevas". Como escreve Nuno Markl hoje no seu twitter, "O Boyle triunfa de novo, enquanto um crítico do Público se vai deitar, agastado..."
"O Estranho Caso de Benjamin Button" levou para casa três prémios (Melhor Cenografia, Maquilhagem e Efeitos Visuais), não deixando, contudo, de ser o grande derrotado da noite.
Sem grandes surpresas, Sean Penn, Kate Winslet, Penélope Cruz e Heath Ledger (condecorado a título póstumo) levaram os prémios de interpretação.
Numa cerimónia completamente invulgar e original, mas muito bem conduzida, Slumdog Millionaire, contra os milhões de Hollywood, ganhou Oscar atrás de Oscar, provando a vitalidade do cinema independente.
quinta-feira, fevereiro 19, 2009
quinta-feira, fevereiro 12, 2009
Já muito se falou sobre a crise económica que abala o Mundo e a confiança de todos. Estamos, talvez, perante a primeira grande crise à escala global e, por isso, aquela que mais desafios coloca a todos os agentes envolvidos, dos decisores ao cidadão comum.
Se me permitirem alguma ironia em tempos de poucos motivos para sorrir, diria que esta crise de que tanto se fala veio, basicamente e tão-somente, pôr em causa tudo que o mundo aprendeu em décadas de estudos económicos e de investimentos financeiros. Nenhum dos paradigmas da ciência económica parece encaixar no cenário complexo que caracteriza o contexto macro-económico contemporâneo.
O chamado modelo económico neoliberal que parecia, até há bem pouco, seguro nos seus fundamentos e generalizável nas suas práticas, parece desmoronar-se como um baralho de cartas à medida que as notícias vão surgindo diariamente, a um ritmo alucinante, nos órgãos de comunicação social.
A vertigem do dinheiro fácil, a segurança do sector financeiro, o panorama perfeito dos paraísos fiscais. Todos estes ilusórios cenários estão transformados em escândalos financeiros, até aqui completamente inimagináveis.
Muitos disseram que nada voltará a ser como dantes. Não poderia concordar mais. Senão vejamos:
Flutuações nos mercados das matérias-primas como as que vimos a assistir nos últimos tempos eram impensáveis há meia dúzia de anos. Falências de instituições financeiras, seguradoras e empresas com uma notória – mas enganosa - sensação de solidez como as que vimos a assistir nos últimos tempos eram impensáveis há meia dúzia de anos. Quedas a pique dos índices bolsistas mundiais como as que vimos a assistir nos últimos tempos eram impensáveis há meia dúzia de anos. Nem mesmo os países emergentes, como a Índia ou a China, habituados a crescimentos anuais na ordem dos dois dígitos, parecem conseguir escapar ao cenário de recessão mundial.
Que modelo económico seria capaz de prever tais cenários? Que modelo económico será capaz de antecipar os desenvolvimentos futuros desta crise? Que modelo económico será capaz de definir as estratégias de combate e de saída do panorama actual?
Já muitos disseram que nada vai ser como dantes. Eu acrescentaria que, qualquer que seja o seu desfecho, esta crise vai ficar registada em todos os manuais de economia e vai inaugurar um novo paradigma de gestão financeira.
E haverá desfechos possíveis?
Numa economia globalizada e “globalizante” como a actual, tudo está relacionado com tudo. Os problemas parecem ser demasiado estruturais porque o próprio paradigma faliu. O sistema, como o habituámos a conceber, definha demasiado para que seja expectável uma auto-regeneração, uma saída de dentro para fora.
Com uma Europa fragmentada e a várias vozes, a necessária mudança no espectro marco-económico decerto terá que surgir vinda dos Estados Unidos da América. Com um fundo mais ou menos emocional, é razoável depositar expectativas na administração Obama, como referimos na nossa última reflexão. E, a partir daí, parece-me que apenas com uma política global convergente e com uma estratégia comum de saída da crise entre Estados Unidos e União Europeia será possível avistar a tal luz ao fundo do túnel que parece insistentemente apagada.
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quarta-feira, fevereiro 11, 2009
terça-feira, fevereiro 10, 2009
Cinemacção
Aí está o Bafta para "Slumdog Millionaire" ("Quem Quer Ser Bilionário?"). Depois do Globo de Ouro, o último filme de Danny Boyle volta a conqusitar a crítica, recebendo o galardão máximo em Inglaterra. Não se trata, efectivamente, de uma obra consensual. Na minha opinião, o realizador já fez, de facto, tão bom ou melhor ("Trainspotting", "28 Dias Depois" ou "Sunshine" não ficam nada atrás de "Quem Quer Ser Bilionário?"). Mas confesso que me espantam algumas críticas destrutivas ao filme. Sem ser um primor interpretativo (não espanta, por isso, que nenhum dos actores tenha recebido qualquer nomeação para a cerimónia dos Óscares do próximo dia 22), o filme é possuidor de um excelente argumento, é esplendoroso em termos musicais, tem uma óptima fotografia e (e, preciosismos e características técnicas à parte, é isto que interessa no final) é uma obra que cativa o espectador do primeiro ao último minuto. Uma mágica e oportuna lição de vida e de amor... Afinal não é essa a grandeza do cinema?
"Quem Quer Ser Bilionário?" é, sem dúvida, o filme do ano.
terça-feira, fevereiro 03, 2009
Verdadeiramente do arco da velha
Hoje, o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol decidiu que o adversário do Benfica na meia-final da Taça da Liga será o Vitória de Guimarães.
O critério definido como primeira fórmula de desempate é o "goal-average", que o Belenenses considera ser superior ao do Guimarães: 2 do Belenenses, fruto de dois golos marcados a dividir por um sofrido, contra 1,5 do Vitória, fruto de três golos marcados a dividir por dois sofridos.
A Liga rejeitou sempre a noção defendida pelos azuis de "quociente entre golos marcados e sofridos", argumentando que a "expressão goal-average reporta-se à diferença entre golos marcados e sofridos", o que "corresponde ao entendimento comum na linguagem corrente do futebol".
Ora não é necessário perceber muito de inglês para concluir que "goal-average" (média de golos) é bem diferente de "best boal difference" (melhor diferença de golos). Ou seja, o Belenenses parece ter razão em qualquer parte do mundo. Menos em Portugal.
A justificação evocada pelo Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol não se baseia na letra dos regulamentos, antes no teor do recurso dos azuis do Restelo.
Entretanto, João Barbosa, que preside à Comissão de Gestão do Belenenses, disse à TSF esperar que esta decisão faça lei.
«Registamos que o Conselho Superior de Justiça tomou uma decisão que abre aqui um principio importante. A partir de agora todas as decisões do CJ independentemente do que escreve a letra do regulamento atenderão à forma como são apresentados os recursos».
Seja como for, a presença do V. Guimarães nas meias-finais da Taça da Liga, a realizar amanhã, dia 4 de Fevereiro, estará sempre ferida de ilegalidade. Mais uma história do arco da velha directamente da "Tugalândia".
Mais pormenores aqui.